- Liat e o pai, o rabino More Ventura, com o candelabro da celebração do Hanukkah
Liat Ventura, de 13 anos, é uma delas. Judia e filha de rabino, a menina nunca ganhou um presente de Natal, mas diz não se importar com isso. "Quando era bem menor, até queria ganhar alguma coisa também, pedia para meus pais. Mas eles me explicavam e eu acabava entendendo que aquela era uma festa para algumas pesssoas, mas não para nós", conta.
Ainda que não comemore, já participou de uma ceia de Natal na casa de amigos da família, uma experiência que classifica como "maravilhosa". "Tenho amigos cristãos, amigos judeus, e não existe nenhum constrangimento por causa do Natal. Mas é claro que meus amigos não ficam falando ‘ganhei isso’, ‘ganhei aquilo’", afirma.
O pai de Liat, o rabino More Ventura, diz que mesmo os judeus não conseguem ficar completamente alheios ao Natal no Brasil. "Minha família está no país há cem anos, estamos rodeados de amigos que estão em festa, então também ficamos felizes", afirma. Por isso, participa de bom grado de confraternizações, amigos secretos, ajuda em caixinhas para funcionários e gosta de ver corais e enfeites de Natal pelas ruas. "Por mais que a gente não comemore, a gente se sensibiliza."
Além disso, para os judeus, o mês de dezembro também é um mês de festivo. Nesta época eles celebram o Hanukkah, ou festa das luzes. A comemoração dura oito noites e lembra uma vitória dos judeus contra uma província grega que tentava impor o politeísmo, há 2.200 anos. Também teria havido um milagre: o óleo para acender as velas do templo, que seria suficiente para apenas um dia, durou oito. "A gente junta a família, canta, come, acende o candelabro e conta a história da data", conta o rabino sobre como a festa é celebrada. "Muito interessante que em alguns prédios em Higienópolis (bairro com alta concentração de judeus em São Paulo), enfeita-se a entrada com uma árvore de Natal e um candelabro, lado a lado."
As irmãs Taynara e Tasnim Mustafa, de 10 e 4 anos, são muçulmanas como os pais e, por isso, também não comemoram o Natal. Como Liath, nunca acreditaram em Papai Noel, mas ainda assim, é comum ganharem algum presente dos parentes da mãe, que são cristãos. Mesmo quando não recebe nada, Taynara garante que não se incomoda: "Sei que são coisas que não preciso. Se eles me derem, pego por respeito".
- Hanan Mustafa e as filhas são muçulmanas, mas gostam de ver a cidade enfeitada
Hanan e as filhas Taynara e Tasnim são muçulmanas, mas gostam de ver a cidade enfeitada
As filhas parecem ter aprendido a lição. Questionada se já contou para algum colega que Papai Noel não existe, Taynara garante que nunca fez isso. "Cada um pensa o que gosta. Eu acredito que não existe, mas tem criança que acredita", diz.
Mesmo que elas não estejam celebrando, as meninas gostam de ver a cidade enfeitada por causa da festa cristã. "Não temos problemas em levá-las para ver árvore de Natal ou Papai Noel no shopping, pois não podemos esconder. E, vamos combinar, são lindas de se ver as decorações", diz Hanan.
Cristãos sem Natal
Ironicamente, entre as religiões que não comemoram o Natal, as duas que têm maior número de adeptos no Brasil são cristãs: a Congregação Cristã no Brasil e os Testemunhas de Jeová. Embora tenham Jesus como salvador, os membros dessas Igrejas alegam que ele não nasceu nesse período do ano, que a Biblía não orienta a comemorar o nascimento de Cristo, e que a festa de Natal é puramente comercial.
Mãe de duas meninas pequenas, de 7 e 2 anos, e membro da Congregação Cristã no Brasil desde que nasceu, Tatiane Gonçalves afirma que as crianças não sentem falta do Natal se tudo for bem explicado. "Minha mãe dizia isso para mim quando eu era pequena, e é o que digo a elas: amar, estar com a família, trocar presentes com quem a gente gosta são coisas que devem ser feitas o ano inteiro, não em um dia só. O Natal é comércio", diz.
Como a muçulmana Hanan, embora não dê presentes, Tatiane tampouco proíbe que outras pessoas presenteiem suas filhas. "A Giovana (a filha mais velha) faz aniversário em dezembro e tem uma tia que sempre dá dois presentes, dizendo: um pelo aniversário, outro pelo Natal. Ela abre e brinca com os dois sem questionar", conta.
Para a mãe, a questão do Natal só fica um pouco mais complicada de explicar para as filhas quando se trata dos enfeites. "Claro que uma árvore enfeitada é bonita, mas para a gente é como uma idolatria. Esse é um ponto é difícil de as crianças pequenas entenderem. Então, quando vamos a um shopping, deixo elas verem, se divertirem, mas logo chamo atenção para outra coisa e elas esquecem", conta.
Fonte: UOL Notícias
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